Por mais que se fale em pluralidade e diversidade cultural no Brasil, basta observar como a mídia nacional trata o forró eletrônico para perceber que esse discurso nem sempre se traduz na prática. O gênero, que movimenta multidões no Nordeste e carrega décadas de história, continua sendo alvo de uma representação enviesada e reducionista por parte das principais emissoras de televisão do país.
Em 2009, a banda Calcinha Preta protagonizou um marco histórico: tornou-se o primeiro grupo de forró eletrônico a ter uma música incluída na trilha sonora de uma novela da TV Globo. A canção “Você Não Vale Nada” ganhou destaque nacional ao embalar cenas da novela Caminho das Índias, e o sucesso foi tanto que rendeu à banda prêmios como o Troféu Imprensa e o Melhores do Ano, do Domingão do Faustão. Foi, sem dúvida, um momento simbólico de conquista de espaço no cenário nacional.
Apesar do feito, a escolha da música — com conotação pejorativa e de duplo sentido — acabou reforçando estereótipos negativos sobre o gênero. Esse padrão de visibilidade condicionada a letras provocativas se repetiu com outras bandas.

O Aviões do Forró, por exemplo, teve duas músicas incluídas em novelas da Globo: “Correndo Atrás de Mim” em Avenida Brasil (2012), e “Ovo de Codorna” em Morde & Assopra (2011). Embora seja positivo ver o forró presente em trilhas nacionais, a seleção ainda ignora o vasto repertório mais lírico, emotivo e romântico, que também define o estilo.
O que vemos é um forró constantemente filtrado, resumido a uma caricatura midiática. A verdadeira diversidade do gênero raramente tem espaço. Onde estão, nas telas da TV, as letras que falam de saudade, das dores e alegrias do povo, do amor com simplicidade e intensidade? Estão fora do enquadramento.

Esse preconceito também se manifesta na cobertura das festas juninas, que, apesar de sua grandiosidade, continuam sendo tratadas como eventos regionais. Festas como o São João de Caruaru (PE), o São João de Campina Grande (PB) — que disputa o título de maior do mundo — e o Arraiá do Povo, em Aracaju (SE), são espetáculos culturais de enorme relevância, mas não recebem transmissões ao vivo em rede nacional, como acontece com o Carnaval no Sudeste. Sem falar no concurso de quadrilhas juninas. É um silêncio sintomático: invisibiliza tradições populares que não se encaixam na lógica televisiva centrada no eixo Rio-São Paulo.

A omissão ficou ainda mais evidente no especial Globo 60 Anos. Um programa que se propôs a homenagear a história da emissora e da cultura nacional… e ignorou completamente o forró. Não é descuido: é sintoma. Um retrato claro de uma mídia que insiste em colocar o Nordeste à margem quando o assunto é cultura de prestígio.
Está mais do que na hora de romper com esse preconceito velado, disfarçado de curadoria editorial. O forró eletrônico é arte, é história, é identidade de um povo inteiro. E merece o mesmo espaço, o mesmo palco e o mesmo respeito dado a outros gêneros consagrados nas vitrines da televisão brasileira.